Por Ingrid Janaina da Silva Foresto
Mais de 300 milhões de pessoas com depressão*. Este é o número que a Organização Pan-Americana da Saúde estimou existir em 2018, em todo o mundo. O dado inclui todas as idades. Agora, três anos depois, diante do quadro de calamidade na saúde vivida em todo o planeta, resultado da pandemia da Covid-19, é provável que esse número tenha aumentado.
A pandemia implica em uma ruptura com o modo de vida que as pessoas estavam habituadas. Estas mudanças requerem adaptação a maior parte do nosso comportamento. Isso exige muito de nós, associado às demandas usuais da vida, seria como aprender a viver novamente. No Escotismo não foi diferente, tivemos que criar novas rotinas e formas de aplicação do método escoteiro que nunca imaginavámos ser preciso. Com isso, tivemos um aumento considerável aos prejuízos à saúde mental de todos os seres humanos, independente de sua faixa etária.
Entretanto gostaria de chamar atenção para o efeito da pandemia na saúde mental de nossas crianças e adolescentes, já que a maioria teve as rotinas afetadas, com restrição de interação social e circulação pelos espaços que estavam acostumadas, como a escola, o grupo escoteiro e a casa de amigos e parentes. Além disso, algumas crianças podem estar vivenciando dificuldades financeiras ou perda de familiares ou pessoas próximas, inclusive falamos sobre Luto e despedida vividos nesse tempo, em outra publicação aqui do Blog. Isso interfere no senso de segurança e estabilidade, que pode se refletir em dificuldade de concentração, irritabilidade, agressividade, medo, inquietação, tédio, sensação de solidão, alterações de sono e de apetite. Elas também podem demonstrar comportamento regressivo, como chupar o dedo ou fazer xixi na cama, por exemplo.
Com mais tempo disponível, as crianças e jovens têm usado e abusado da tecnologia, uma aliada para diminuir os impactos do isolamento social e continuar com as atividades, inclusive as escoteiras. Porém, é preciso impor limites para o uso do celular, computador ou outro equipamento eletrônico.
Com a chegada da vacina surge outra preocupação: o retorno à sociedade e as questões comportamentais que isso envolve. Como ser aceito presencialmente depois de quase dois anos isolados? Entre a vida online ou presencial é mais do que necessário falar de saúde mental, por isso o mês de Setembro é escolhido para ser dedicado à prevenção e conscientização contra o suicídio.
Por que Setembro Amarelo?
Cerca de 12 mil suicídios são registrados todos os anos no Brasil e mais de 1 milhão no mundo. Em 2003, a Organização Mundial da Saúde (OMS) instituiu o dia 10 de setembro para ser o Dia Mundial da Prevenção do Suicídio.
O amarelo foi adotado como a cor da campanha por conta da trágica história de Mike Emme, um jovem americano, de 17 anos que, em 1994, tirou a própria vida dirigindo seu carro amarelo. Seus amigos e familiares distribuíram no funeral cartões com fitas amarelas e mensagens de apoio para pessoas que estivessem passando pelo mesmo desespero. Aproveitando a data mundial, a campanha Setembro Amarelo foi criada no Brasil em 2015.
Entendendo o suicídio - Saber, agir e prevenir.
O suicídio é um fenômeno complexo, multifacetado e de múltiplas determinações, que pode afetar indivíduos de diferentes origens, classes sociais, idades, orientações sexuais e identidades de gênero, e estamos muito enganados se imaginamos que jovens praticantes do Escotismo não se enquadram neste grupo.
Mas o suicídio pode ser prevenido! Saber reconhecer os sinais de alerta em si mesmo ou em alguém próximo a você pode ser o primeiro e mais importante passo. Por isso, preste atenção se a pessoa com quem você convive demonstra comportamento suicida e procure ajudá-la.
Sinais de alerta - Prevenção do suicídio.
Os sinais de alerta descritos abaixo não devem ser considerados isoladamente. Não há uma “receita” para detectar seguramente quando uma pessoa está vivenciando uma crise suicida, nem se tem algum tipo de tendência. Entretanto, um indivíduo em sofrimento pode dar certos sinais, que devem chamar a atenção de seus familiares e amigos próximos, sobretudo se muitos desses sinais se manifestam ao mesmo tempo:
- O aparecimento ou agravamento de problemas de conduta ou de manifestações verbais durante pelo menos duas semanas;
- Preocupação com sua própria morte ou falta de esperança;
- Expressão de ideias ou de intenções suicidas. Fiquem atentos para os comentários do tipo: Pode parecer óbvio, mas muitas vezes são ignorados: "Vou desaparecer.” “Vou deixar vocês em paz.” “Eu queria poder dormir e nunca mais acordar.” “É inútil tentar fazer algo para mudar, eu só quero me matar.”
- Isolamento;
- Outros fatores.
Exposição ao agrotóxico, perda de emprego, crises políticas e econômicas, discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, agressões psicológicas e/ou físicas, sofrimento no trabalho, diminuição ou ausência de autocuidado, conflitos familiares, perda de um ente querido, doenças crônicas, dolorosas e/ou incapacitantes, entre outros podem ser fatores que vulnerabilizam, ainda que não possam ser considerados como determinantes para o suicídio. Sendo assim, devem ser levados em consideração se o indivíduo apresenta outros sinais de alerta para o suicídio.
Como trabalhar a campanha Setembro Amarelo nas UELs?
- Faça palestras. Um dos principais objetivos da campanha Setembro Amarelo é enfrentar o problema de frente;
- Promova rodas de conversa entre os jovens;
- Estimule o desenvolvimento das habilidades socioemocionais;
- Espalhe cartazes pela sua UEL;
- Incentive o acompanhamento profissional;
- Desde 2020 temos um Módulo de Aperfeiçoamento de Saúde Mental na Região SP do Escoteiros EAD e o mesmo tem uma unidade inteira dedicada ao combate ao suícidio.
Para falarmos de saúde mental e especialmente o combate ao suídicio, precisamos de alguns cuidados muito importantes:
1. Primeiramente, se você for falar em sua UEL ou postar em uma rede social sobre o assunto, faça um anúncio inicial de que assunto será esse.
Por ser um conteúdo delicado, é importante a pessoa escolher se quer ou não ouvir sobre isso sem ser pega de surpresa.
2. Não faça discursos de positividade “tóxica”. Mesmo que sua intenção seja ajudar, algumas frases podem trazer sofrimento e sentimento de culpa para quem escuta.
Exemplos do que NÃO dizer:
- “Não cometa suídicio porque a vida é linda”,
- “Aprenda a ser grato ao que você tem”,
- “Tem tantas pessoas passando por situação pior que a sua..”
3. Não reduza a dor do outro e não tente encontrar uma justificativa simplista para o que está passando.
Por exemplo, não diga:
- “Ah mas você está assim porque parou de ir a igreja”
- “Isso é falta de Deus no coração”
- “É falta do que fazer, você está ocioso demais e mente vazia é oficina de pensamentos ruins”
Isso significa não minimizar o sofrimento da pessoa com frases do tipo “ah, para com isso, que besteira, você é uma pessoa tão linda, tem uma vida inteira pela frente”.
5. Não diga aos jovens para te procurar para desabafar ou conversar sobre o assunto, se você não estiver emocionalmente preparado para fazer esse acolhimento.
Além disso, se você se disponibilizar para escutar o outro, procure conhecer recursos que possam verdadeiramente ajudar. Fazer intervenções erradas (como algumas já citadas) pode ser mais prejudicial do que não fazer intervenção nenhuma.
6. Quando disser para a pessoa procurar ajuda, a auxilie a encontrar lugares e pessoas que possam ajudá-la.
Muitas vezes a pessoa se sente perdida sem saber onde buscar essa ajuda que tanto falam para ela procurar .
Como fazer isso:
- Ajude a encontrar um bom psicólogo e um bom psiquiatra. Se necessário, agende e acompanhe até o local da consulta;
- Indique também serviços oferecidos pelo governo gratuitamente;
- Ofereça ajuda para conversar com os pais do jovem.
7. Se você não souber como ajudar, seja franco com a pessoa. Você pode dizer para ela que não sabe muito bem como agir, mas que ela é importante para você e que você estará ao lado dela para apoiar e procurar junto com ela o tratamento que for necessário para aliviar a dor que ela está sentindo.
Filmes que tratam sobre o assunto
Pensando ainda em formas para abordarmos os assuntos pertinentes à saúde mental com nossos jovens e possibilitando as discussões sobre o tema, selecionamos 7 filmes que tratam do assunto Alguns de forma mais leve, como as animações e outros com situações mais explícitas.
- Por lugares incríveis (2020) – uma adolescente de 17 anos que tenta superar o luto pela morte precoce da irmã.
- As vantagens de ser invisível (2012) – um jovem de 15 anos que está depressivo e precisa lidar com o suicídio do melhor amigo.
- Divertida Mente (2015) – A animação da Pixar onde uma garota de 11 anos que precisa lidar com a mudança de cidade e escola, enquanto passa por transformações importantes da transição da infância para a pré-adolescência.
- O Lado Bom da Vida (2012) – Um jovem adulto passou oito meses em um sanatório após uma crise que quase o levou a cometer um assassinato. Ao sair da internação sem casa, trabalho e com o casamento arruinado, ele volta a morar com os pais.
- O Mínimo Para Viver (2017) – Retrata o transtorno alimentar, além de saúde mental, uma jovem que sofre de anorexia e não tem perspectiva de se livrar da doença. Já sem esperança, ela encontra um médico que trata o distúrbio de um modo não muito tradicional e, então, a garota embarca em uma jornada de descoberta e superação.
- Up – Altas Aventuras (2009) – Mais uma animação da Pixar, traz em seu enredo de forma leve, emocionante e divertida, temas importantes como: lidar com o luto, reaprender a viver com a solidão e ir em buscas dos sonhos, mesmo que pareça tarde demais, e ainda tem um personagem escoteiro.
- Viva – A Vida é Uma Festa (2018) – Também é uma animação da Pixar e, diferente dos outros, trata mais diretamente sobre morte natural, por acidente, assassinato ou simbólica, luto e relações familiares de forma lúdica e artística. A morte é o assunto principal, mas não é o foco.
O suicídio precisa ser combatido na nossa sociedade, mesmo ainda sendo um assunto tabu. A desinformação contribui para agravar o problema. A campanha Setembro Amarelo visa conscientizar a população sobre o assunto.
Conhecimento sobre como ajudar, a quem recorrer e como desenvolver empatia são necessários para as pessoas que desejam apoiar quem mostra sinais de desistência de viver.
Sabendo como proceder, todos podem colaborar!
Palavras de compreensão tanto para quem vive o problema como vítima quanto para familiares podem gerar uma mudança favorável. Não precisamos ter as respostas, mas sim estar orientados de onde encontrá-las e acima de tudo acolhermos, respeitarmos e amarmos uns aos outros. Vamos juntos dizer sim a vida!
Contatos que podem ser úteis:
- Centro de Valorização da Vida. Telefone 188. Site CVV.
- Mapa da saúde mental
- Pode falar: Para quem tem entre 13 e 24 anos.
- Email da Equipe Regional de Vida Saudável: joyce.schiezari@escoteirossp.org.br