Três adolescentes morreram numa troca de tiros com policiais militares na zona norte de Piracicaba. Os jovens estavam em um carro roubado, com uma quarta pessoa – que fugiu –, e tinham entre 14 e 17 anos. Assim ficou marcado o início de outubro passado.
Triste ocorrência, hoje regular no cotidiano de muitas cidades brasileiras, a mistura de jovens e violência costuma ser um desafio a pessoas e órgãos dedicados a mudar essa história. O caso acima, registrado no bairro Parque Piracicaba, motivou o Conselho Comunitário de Segurança (Conseg) a desenvolver algo. A iniciativa recebeu o nome de Escoteiro na Escola.
“A idealização do projeto começou numa reunião extraoficial, em meados de outubro”, conta Marcio José Pereira, presidente do Conseg. “Com a preocupação de oferecer atividades extracurriculares que premiassem o entretenimento sadio, o resgate de valores morais, éticos e cívicos, representantes da sociedade civil (Conseg) solicitaram ajuda ao movimento dos escoteiros de Ártemis e da Escola Estadual Prof. Hélio Penteado de Castro [na qual estudavam dois dos mortos no confronto].”
A intenção é afastar os jovens da rede pública de ensino do mundo da criminalidade e assim prevenir fatalidades como a ocorrida no Parque Piracicaba. Também se deseja resgatar a participação das famílias na educação de seus filhos e nas atividades comunitárias, aspecto fundamental para o sucesso dos esforços. Para tanto, o meio será colocando-os em contato com o mé- todo e a prática escoteira.
“Quanto mais escoteiros, cidadãos melhores teremos em nossa sociedade”, acredita Cintia Nogueira, chefe do Grupo Escoteiro João Batista de Ártemis 414/SP. “Os escoteiros fazem amigos e incorporam conceitos importantes de trabalho em equipe, inclusive de respeito ao próximo.”
Para que as sugestões saíssem do papel, uma série de parcerias foi selada – Conseg, Igreja do Parque Piracicaba, direção da Escola Hélio Penteado, representantes do legislativo municipal (vereadora Nancy Thame), Escoteiros de Ártemis e a segurança pública de Piracicaba (Guarda Civil Municipal, Polícia Militar e Polícia Civil).
Dez famílias interessaram-se no programa, somando 15 jovens. O início, ainda em etapa piloto, aconteceu no último sábado (10). Foi o primeiro encontro dos inscritos com os escoteiros de Ártemis. “Estamos abertos a ideias e parcerias. As discussões e propostas continuam sendo levantadas nas reuniões do Conseg”, ressalta o presidente do conselho.
Conforme salienta Cintia, o Escoteiro na Escola integrará o jovem a uma turma que aprende brincando e que está sempre alerta para servir. “Isso contribui bastante para o autodesenvolvimento deles. Durante todo o processo, nós, como chefes escoteiros, trabalhamos a construção de seu caráter. É um complemento ao ambiente escolar e familiar”, diz.
Flávia Baptista, diretora da Escola Hélio Penteado, concorda com o poder de transformação do escotismo. “Pelos princípios e valores de solidariedade e auxílio ao próximo, além da relação dos jovens com Deus (independentemente da religião), com eles mesmos e com a sociedade”, explica. “Quando começamos a ter esse olhar de empatia, de cuidado, vamos deixando a violência de lado.”
Munida desse espírito e da preocupação com os indivíduos que tocarão o futuro, a educadora topou o projeto proposto pelo Conseg. Sua reflexão avança a linha da simples constatação de que diversas crianças estão à mercê da sociedade. Busca, na realidade, a responsabilidade que cada um de nós tem para com o viver em sociedade, para com o próximo.
“Como estamos trabalhando a formação dessas crianças e jovens? Meu objetivo maior, claro, é mantê-los dentro de uma atividade, mas uma atividade saudável. Algo que não seja só o celular e a internet, e sim o contato com a natureza, o respeito pelo outro e o autoconhecimento”, completa Flávia, cuja mentalidade resume bem o espírito do Escoteiro na Escola: “É mudar essa realidade de violência e mostrar outro lugar no mundo para eles, os jovens”.